A esperança no novo Marco Legal do Saneamento

Compartilhe este conteúdo

A agenda para a universalização do saneamento no Brasil é urgentíssima. O diagnóstico atual revela números estarrecedores. Com aproximadamente cem milhões de pessoas sem acesso à coleta de esgoto, trinta e cinco milhões de pessoas sem acesso à água tratada e níveis baixíssimos de tratamento de esgoto e de destinação de resíduos sólidos, o saneamento torna-se um “ponto fora da curva” entre os setores da infraestrutura brasileira.

Segundo dados do Plano Nacional de Saneamento Básico, o custo para universalizar o acesso a estes serviços é da ordem de R$ 508 bilhões, estimados para investimentos entre 2014 a 2033. Estudos mais recentes revelam que esta cifra já chega a algo entre R$ 700 a 800 bilhões. Meta inalcançável, a considerar o nível atual de investimentos no setor, que não chega a R$ 11 bilhões anuais. Com uma agenda tão exigente para investimentos, e sem que os atuais operadores se mostrem aptos a conduzi-la, a busca por um novo modelo para o saneamento afigura-se urgente.

Sob este cenário, iniciaram-se há alguns anos discussões em torno da mudança do modelo de operação desses serviços, especialmente quanto ao abastecimento de água e ao esgotamento sanitário, com vistas a “abrir” o mercado a operadores privados e a superar as ineficiências inerentes à operação estatal. Desta iniciativa, gestada no Programa de Parcerias de Investimento (PPI), resultou a edição da Medida Provisória 844, sucedida pela Medida Provisória 868, sucedidas então pelos Projetos de Lei (do Senado) 3.261/2019 e (da Câmara) 4.162/2019. Este último acabou se convertendo na Lei 14.026/2020, que introduziu diversas inovações importantes nas leis que tratam do saneamento no Brasil.

Seria um eufemismo dizer que a nova legislação apenas atualiza o regime jurídico do saneamento. Ela vai muito além disso. Traz inovações revolucionárias para o modo de operação do saneamento, pondo em xeque o monopólio das companhias estaduais, criando um novo jeito de regular e priorizando uma abordagem regional para o saneamento. Tudo com vistas a ampliar a participação privada no setor e viabilizar investimentos para a agenda de universalização dos serviços de saneamento.

Mas como, afinal, a lei pretende fazer tudo isso?

Em primeiro lugar, proibindo a contratação de serviços de saneamento por meio de contratos de programa, tradicionalmente estabelecidos sem licitação. Com o advento da nova lei, passa a ser vedada a celebração de contratos de programa por via de contratação direta entre os titulares (municípios) e entidades integrantes de estrutura administrativa alheia (companhias estaduais, por exemplo). Com esta vedação, a partir da extinção dos contratos de programa vigentes, os municípios que não pretenderem prestar diretamente esses serviços serão obrigados a licitar a contratação para a sua prestação. A partir disso, cria-se um ambiente competitivo para que operadores públicos e privados possam disputar os contratos, propiciando não apenas ganhos de eficiência aos usuários, mas um maior controle sobre os números da operação.

Em segundo lugar, o novo marco altera o modo de regulação do saneamento. Atualmente, o setor de saneamento conta com dezenas de agências reguladoras (aproximadamente 60), entre agências estaduais, municipais, intermunicipais e distrital. Isso acaba gerando uma regulação fragmentada e heterogênea, o que onera os custos de transação dos operadores. Com vistas a uniformizar a regulação e melhorar a sua qualidade técnica, a nova lei atribui à ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico a competência para editar “normas de referência” sobre o saneamento. Ainda que a União detenha competência constitucional apenas para editar “diretrizes” sobre o saneamento, com vistas a evitar disputas jurídicas em torno da delimitação da competência regulatória, dada a titularidade municipal do serviço, a lei se vale de um soft law, substituindo o enforcement normativo típico pelo uso de seu spending power como fator de indução dos entes e agências regionais e locais a aderirem à regulação nacional. Não terão acesso a recursos e financiamentos federais aqueles entes que não seguirem as “normas de referência” da ANA.

Em terceiro lugar, a nova lei impõe um olhar regional para o saneamento, induzindo à prestação regionalizada do serviço. A ideia é evitar tanto quanto possível que a operação do serviço seja conduzida individualmente pelos municípios, desconsiderando-se as implicações regionais. Num contexto de abertura do mercado a operadores privados, a abordagem regional inibe o fenômeno do cherry picking (a escolha seletiva pelo mercado apenas dos bons negócios), viabiliza subsídios cruzados entre operações rentáveis e deficitárias, e contribui para a universalização do serviço em regiões menos favorecidas.

Por fim, as inovações legislativas também buscam encorajar a privatização das companhias estaduais. Sob a legislação antiga, a venda do controle estatal dessas empresas acarretava paradoxalmente na extinção automática dos contratos de programa, o que inviabilizava a operação. Afinal, o valor das ações dessas companhias está diretamente relacionado à extensão de seu direito de explorar o serviço nos municípios. Bem por isso, a nova legislação cria um processo simplificado para adequar o conteúdo aos prazos dos contratos de programa vigentes com vistas a viabilizar a venda do controle em condições favoráveis. É um estímulo aos Estados para que ponham à venda o controle de suas companhias de saneamento.

Lembre-se que os contratos de programa vigentes, embora preservados, terão de se adaptar às exigentes metas de universalização estabelecidas com a nova legislação (99% para a coleta e o tratamento de esgoto e 90% para o abastecimento de água potável, até 2033), assim como às metas quantitativas de não intermitência do abastecimento, de redução de perdas e de melhoria dos processos de tratamento, o que pode reforçar o incentivo a que os Estados ponham suas companhias em rota de privatização. Afinal, não será simples para muitas delas, ressentidas da perda de capacidade de investimento, cumprir essas metas. Inclusive porque a lei passa a exigir a demonstração de sua capacidade econômico-financeira para tanto.

São estas, enfim, as principais inovações que a Lei 14.026/2020 trouxe para o saneamento, introduzindo alterações em diversas leis que tratam do tema. Todas elas, que se fundamentam no mesmo objetivo de viabilizar o desenvolvimento de uma agenda de universalização para o setor, compõem um novo modelo de regulação e operação do serviço. São inovações que, como dito, vão muito além de um mero facelift normativo. Têm potencial revolucionário. Pois para sairmos de onde estamos e atingirmos os parâmetros de universalização desejados, precisamos revolucionar. Há uma esperança no novo marco legal do saneamento.

[/vc_column_text][vc_empty_space height=”36px”][ultimate_heading main_heading=”Guia jurídico para entender o Marco Legal do Saneamento” main_heading_color=”#ff9000″ alignment=”left” main_heading_font_family=”font_family:Open Sans|font_call:Open+Sans|variant:600″ main_heading_style=”font-weight:600;” main_heading_font_size=”desktop:20px;”][/ultimate_heading][ultimate_spacer height=”15″ height_on_tabs=”15″ height_on_tabs_portrait=”15″ height_on_mob_landscape=”15″ height_on_mob=”15″][vc_accordion active_tab=”1″ title_size=”h4″ style=”2″][vc_accordion_tab title=”Como será feita a regulação do setor de saneamento?”][vc_column_text]

Sem eliminar a regulação do saneamento por meio dos entes titulares e de agências regionais, locais, intermunicipais ou interfederativas, a nova lei atribui à ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico competência para instituir “normas de referência” sobre o serviço de saneamento. Em princípio, tais normas de referência fazem as vezes das “diretrizes”, cuja edição é de competência da União (art. 21, XX, CF), em complementação à Lei 11.445/2007. No entanto, o elenco de matérias estabelecido com a nova legislação para ser objeto de regulação federal no âmbito do saneamento é bastante específico, desafiando os limites da competência constitucionalmente atribuída à União para tal. Precisamente por isso é que a nova lei, alternativamente a impor a regulação federal em detrimento da regulação regional ou local, optou por induzir a sua observância pelos entes titulares e demais reguladores. Substitui-se o enforcement por um soft law, fazendo uso do spending power da União: os entes que não tiverem adesão às normas de referência editadas pela ANA estarão privados do acesso a “recursos públicos federais ou a contratação de financiamentos com recursos da União ou com recursos geridos ou operados por órgãos ou entidades da administração pública federal”, nos termos do artigo 50 da Lei 11445/2007, como estabelece o novo artigo 4º-B introduzido na Lei 9.984/2000.

O objetivo de afetar e aparelhar uma agência nacional para prover as diretrizes da regulação para o saneamento é desejável. O diagnóstico atual revela uma regulação fragmentada, diversificada e de baixa qualidade. Uma regulação muito diversificada enseja a ampliação dos custos de transação dos operadores, que têm de lidar com diferentes regramentos na operação do serviço. Espera-se que a uniformização da regulação e o incremento de sua qualidade técnica possam contribuir para melhorar a segurança jurídica e a adequação técnica da regulação, o que certamente criará um ambiente regulatório mais propício para a atração de investimentos privados para o setor e para a ampliação da eficiência na prestação do serviço.

Importante mencionar que o objetivo de implementar uma regulação nacional para o saneamento poderá favorecer uma visão regional desse serviço, em substituição a um enfoque restritamente municipal. Aliás, esse parece ter sido um dos propósitos que inspiraram o novo modo de regulação, que, neste caso particular, é complementado por uma série de novas normas voltadas a viabilizar o exercício da “prestação regionalizada” do saneamento. É perceptível que este esforço feito pelo legislador para contornar as dificuldades locais através da busca por um enfoque regional para a operação do serviço tem origem no reconhecimento do problema-raiz do tratamento jurídico do saneamento no Brasil: a titularidade municipal.

[/vc_column_text][/vc_accordion_tab][vc_accordion_tab title=”Qual o impacto da nova legislação sobre a operação do serviço por meio de contrato de programa estabelecido sem licitação entre o titular e entidades integrantes de outra estrutura administrativa?”][vc_column_text]

Com vistas a estimular a ampliação da participação no setor, a Lei 14.026/2020 introduziu nova redação ao artigo 10 da Lei 14.445/2007, estabelecendo que a prestação dos serviços públicos de saneamento básico por entidade que não integre a Administração do titular depende da celebração de contrato de concessão, mediante prévia licitação. E expressamente vedou a sua disciplina por meio de contrato de programa, convênio, termo de parceria ou outros instrumentos de natureza precária. Além disso, a Lei 14.026/2020 deu nova redação ao § 8º do artigo 13 da Lei 11.107/2005, vedando a formalização de contratos de programa para a prestação de serviços públicos de saneamento.

Estas normas afastam a incidência da regra do artigo 24 da Lei 8.666/93 à contratação de serviços de saneamento, que até então legitimava a contratação direta entre os titulares e entidades integrantes de outra estrutura administrativa para a operação do serviço. Com o advento da nova regra, os municípios que desejarem contratar operadores institucionais que não integrem a sua estrutura administrativa para a prestação dos serviços de saneamento terão de promover processo licitatório. Isso abre a possibilidade para que operadores privados possam disputar as contratações em igualdade de condições com os operadores institucionais, promovendo maior competitividade ao setor e viabilizando, como consequência, ganhos de eficiência à operação do serviço.

Esta regra terá forte impacto no âmbito da prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, que atualmente é executado majoritariamente por companhias estaduais mediante contratos de programa celebrados sem licitação com os município-titulares. Já quanto a outras atividades de saneamento, como a coleta, transporte e a destinação de resíduos sólidos, a repercussão prática será pequena, em vista do fato de que estes apenas excepcionalmente têm sido operados por entidades alheias à estrutura organizacional dos titulares (embora tenha o potencial de inibir futuramente a proliferação desta forma de contratação de serviços de saneamento).

[/vc_column_text][/vc_accordion_tab][vc_accordion_tab title=”Os contratos de programa vigentes serão preservados? Há necessidade de sua adaptação aos parâmetros de universalização estabelecidos com as novas normas legais?”][vc_column_text]

A nova legislação ressalva – como não poderia deixar de ser – a preservação dos contratos de programa vigentes quando de sua publicação, que seguirão válidos até o advento de seu termo (art. 10, § 3º, Lei 11.445/2007). Sem possibilidade de renovação, subtraída com o veto presidencial ao artigo 16 da Lei 14.026/2020, a extinção dos contratos de programa imporá a obrigatoriedade de os municípios ou licitarem a contratação destes serviços ou se valerem de outras formas acolhidas pela legislação para tal.

E quanto aos contratos de programa sem prazo certo? Estes serão considerados “precários”, a teor do § 8º do artigo 11-B da Lei 11.445/2007, por violarem o artigo 13 da Lei 11.107/2005.

Vale lembrar que a versão original do projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional continha regra prevendo que “as situações de fato dos serviços públicos de saneamento básico por empresa pública ou sociedade de economia mista” poderiam ser reconhecidas como “contratos de programa”, formalizadas ou renovadas mediante acordo entre as partes até 31 de março de 2022 (artigo 16). Este dispositivo foi objeto de veto presidencial, sob a alegação de que a regra prolongava demasiadamente “soluções para os impactos ambientais e de saúde pública decorrentes da falta de saneamento básico e da gestão inadequada da limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos”.

Muito embora o § 3º do artigo 10 da Lei 11.445/2007 preserve a vigência dos contratos de programa em curso, o § 1º do artigo 11-B da mesma Lei exige que os contratos em vigor, à exceção daqueles que resultaram de processo licitatório, deverão incorporar, até 31 de março de 2022, metas de universalização “que garantam o atendimento de 99% (noventa e nove por cento) da população com água potável e de 90% (noventa por cento) da população com coleta e tratamento de esgotos”. Além disso, também será obrigatória a incorporação de metas quantitativas de não intermitência do abastecimento, de redução de perdas e de melhoria dos processos de tratamento.

Esta exigência não atinge diretamente os contratos de concessão originados de licitação, ainda que para estes a lei imponha ao titular do serviço o dever de buscar alternativas para o cumprimento das metas, seja por meio de prestação direta, seja por aditamento aos contratos (mantido o equilíbrio econômico-financeiro), seja por meio de nova contratação. A exigência também alcança as operações municipais de saneamento.

Já quanto aos contratos de programa, a lei estabelece o prazo de até 31 de março de 2022 para que incorporem as referidas metas. Teoricamente, essa adaptação imporia a necessidade de seu reequilíbrio econômico-financeiro, com vistas a compensar os novos investimentos não considerados no fluxo de caixa original destes contratos. O problema é que, na prática, os contratos de programa, em sua grande maioria, são lacônicos, com uma disciplina relapsa no que tange à matriz de riscos e parâmetros de reequilíbrio. Mais do que isso, a contabilidade destas operações dificilmente é segregada, dificultando a verificação do volume de investimentos efetivamente amortizado ao longo de sua execução. Com isso, será um desafio a atribuição de responsabilidade sobre a compensação pelos novos investimentos que haverão de ser implementados para a busca do atingimento das metas de universalização impostas pela legislação.

Importante perceber que a nova legislação exige que os operadores demonstrem a sua capacidade de promover esses investimentos, seja por meio de recursos próprios, seja por meio da contratação de dívida. Esta demonstração de capacidade econômico-financeira será exigida nos termos de metodologia instituída por meio de decreto regulamentar (a ser editado em até 90 dias da publicação da Lei 14.026/2020).

Como dito, essa exigência, num contexto em que as companhias estaduais se ressentem da perda da capacidade de investir, inclusive pela dificuldade de tomar crédito, poderá estimular os Estados a trilhar o caminho da sua privatização ou buscar desenhos jurídico-institucionais alternativos que favoreçam a transferência da operação dos serviços a operadores privados. Incentivo semelhante terão os Municípios a transferir a prestação dos serviços a operadores privados, quando o serviço estiver sendo operado no âmbito municipal.

O não atingimento destas metas foi tratado com rigor pelas novas regras, prevendo-se a possibilidade de aplicação de sanções aos operadores e da decretação de caducidade da concessão pela agência reguladora, observada a necessidade de processo com ampla defesa e contraditório.

[/vc_column_text][/vc_accordion_tab][vc_accordion_tab title=”Quais as modalidades de prestação dos serviços de saneamento admitidas com as mudanças na legislação?”][vc_column_text]

Com o advento da vedação à celebração de contratos de programa entre Municípios e as companhias estaduais (forma jurídica que tem prevalecido historicamente para a prestação deste serviço), quais as modalidades e os desenhos jurídico-institucionais possíveis para a prestação desse serviço?

Em primeiro lugar, é claro que os Municípios seguem tendo a possibilidade de prestação direta do serviço, ou mediante a criação de entidades que integrem sua estrutura administrativa (como autarquia, empresa pública ou sociedade de economia mista) ou mediante a contratação, por meio de licitação, de operadores (públicos ou privados) que não integrem a sua estrutura administrativa. No entanto, é preciso observar que, de acordo com a nova regra do inciso XVI do artigo 2º da Lei 11.445/2007, um princípio fundamental da prestação do serviço de saneamento é a prestação regionalizada “com vistas à geração de ganhos de escala e à garantia da universalização e da viabilidade técnica e econômico-financeira dos serviços”.

Em segundo lugar, o serviço poderá ser prestado por meio de consórcios intermunicipais, que poderão prestar o serviço diretamente, por meio de autarquia intermunicipal criada para esse fim, ou, indiretamente, pela via da subdelegação ou de contratação de terceiro, por meio de licitação.

Em terceiro lugar, os entes federados podem estabelecer gestão associada para a gestão do serviço, desde que sua prestação esteja amparada por um contrato de concessão oriundo de licitação. No âmbito da gestão associada, nada impedirá que um ente delegue a outro as atribuições necessárias para a contratação da prestação do serviço por meio de licitação.

A gestão associada poderá também se prestar a transferir atribuições a um ente federado com vistas a viabilizar a prestação regionalizada do serviço, no âmbito de região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião, de unidade regional de saneamento ou de blocos de referência. Em todos estes casos, haverá o desempenho de prestação regionalizada dos serviços de saneamento, a partir da criação de estruturas de governança interfederativa, que passarão a exercer a titularidade do serviço.

Neste contexto, é provável que os Estados também sigam tendo uma participação relevante na prestação dos serviços de saneamento, funcionando como os principais atores institucionais a estruturar concessões e parcerias público-privadas para este fim, delegatários de atribuições transferidas no âmbito da gestão associada pelos municípios e pelas estruturas interfederativas. Este protagonismo dos Estados é mais visível no âmbito das regiões metropolitanas, em que a lei o define como cotitular do serviço, mas também poderá se verificar em outros arranjos institucionais em que, por meio de gestão associada, ele seja encarregado de gerir o serviço e estruturar delegações a operadores privados por meio de concessões.

[/vc_column_text][/vc_accordion_tab][vc_accordion_tab title=”Qual o limite imposto para a “subdelegação” dos serviços de saneamento operados por meio de contrato? Este limite é extensível às PPPs?”][vc_column_text]

O novo artigo 11-A da Lei 11.445/2007 estabelece uma restrição à “subdelegação” na hipótese de prestação de serviços públicos de saneamento por meio de contrato. O objetivo da regra parece ter sido o de evitar que as companhias estaduais possam, ao subdelegar a prestação do serviço, funcionar como intermediários da operação, onerando sem justa causa o usuário. Esta regra compõe um conjunto de normas voltadas a gerar incentivos à privatização das companhias estaduais ou à sua exclusão do ciclo da prestação do serviço.

O problema é que esta norma se ressente de uma técnica legislativa sofrível. A dúvida está em saber se a incidência do limite dos 25% está restrita aos casos de “subdelegação” de concessões comuns ou se alcança as parcerias público-privadas. Note-se que a extensão desta limitação às PPPs pode ter grande repercussão prática, dada a iniciativa de muitas companhias estaduais à estruturação de concessões administrativas para a coleta e o tratamento do esgotamento sanitário. A exclusão das parcerias público-privadas deste limite poderá encorajar a transferência da operação do serviço (seja de abastecimento de água ou de esgotamento sanitário) a prestadores privados por meio de concessões administrativas.

Uma interpretação gramatical do caput do artigo 11-A conduz à conclusão de que o limite incidirá apenas quando houver “subdelegação”, excluindo-se as hipóteses de parcerias público-privadas. Sob os termos da norma, “subdelegação” é hipótese inconfundível com “parceria público-privada”, sendo que apenas aquela está submetida à restrição dos 25%. Por isso, parece-me que a interpretação mais acertada para a aplicação desta regra é a que livra as PPPs da incidência da restrição. Sequer incidirá sobre as PPPs o condicionamento imposto pelo § 1º do mesmo artigo 11-A à “comprovação técnica por parte do prestador de serviços, do benefício em termos de eficiência e qualidade dos serviços públicos de saneamento básico”.

Mas não se ignora que uma interpretação sistemática do referido artigo 11-A poderia conduzir a uma leitura alternativa, com vistas a submeter as hipóteses de PPPs à referida limitação de 25%. Isso porque, segundo a confusa redação do § 4º deste artigo, uma vez ocorrida a hipótese descrita na norma, o limite de 25% estaria flexibilizado para concessões e parcerias público-privadas. Do que se conclui, a contrario sensu, que a restrição prevista no caput alcançaria também as PPPs, sob pena de se presumir a inutilidade das palavras do § 4º, neste particular.

De todo o modo, não creio que o disposto no § 4º tenha o condão de infirmar a letra do caput do artigo 11-A, que é claro ao afastar as PPPs da incidência do limite de 25%.

Por isso, insisto que a melhor interpretação para a regra é aquela que livra as PPPs da incidência do referido limite, tendo em vista os termos da norma do caput.

É possível que a regulamentação se esforce para corrigir os defeitos redacionais destas normas, direcionando a sua interpretação. No entanto, dado o seu caráter de ato normativo secundário, parece-me não haver espaço para que o regulamento infirme a disposição da regra do caput do artigo 11-A. Por isso, creio que a interpretação da norma que merece prevalecer é aquela que restringe a incidência do limite de 25% às hipóteses de subdelegação – deixando de fora de seu âmbito as PPPs.

[/vc_column_text][/vc_accordion_tab][vc_accordion_tab title=”13) A referida limitação à “subdelegação” incidirá sobre as contratações de longo prazo abrangentes de municípios integrantes da região metropolitana que já estavam em estruturação pelos operadores signatários de contratos de programa quando do início de vigência da nova lei?”][vc_column_text]

A (não)incidência do limite de 25% a subdelegações sob estruturação quando do início de vigência da lei é uma dúvida que se origina da truncada redação da regra contida no § 4º do artigo 11-A artigo da Lei 11.445/2007.   A letra da norma é de difícil compreensão. Segundo o seu texto, “os Municípios com estudos para concessões ou parcerias público-privadas em curso, pertencentes a uma região metropolitana, podem dar seguimento ao processo e efetivar a contratação respectiva, mesmo se ultrapassado o limite previsto no caput deste artigo, desde que tenham o contrato assinado em até um ano”. Esta regra parece descontextualizada das demais normas contidas no artigo 11-A. Em primeiro lugar, porque o caput trata da prestação de serviços por meio de contrato, com vistas a limitar a subdelegação “do objeto contratado”. Está endereçada ao prestador do serviço contratado pelo titular (ou por quem lhe represente). Já a regra do § 4º do artigo 11-A trata da hipótese de estruturação de concessões e PPPs diretamente pelos Municípios integrantes de região metropolitana. É endereçada aos titulares do serviço e não aos seus prestadores. Não cabe falar em subdelegação do objeto contratado pelos Municípios. Logo, parece difícil conciliar o § 4º com o caput do artigo 11-A. Todavia, e para conferir interpretação racional para a norma, seria de se supor que o seu destinatário serão os prestadores de serviço contratados pelos titulares. Sob esta interpretação corretiva da técnica redacional deficiente, os prestadores de serviços contratados pelos titulares, ou por quem os represente, estariam livres da observância daquele limite no que diz respeito à estruturação de concessões e PPPs já em curso quando do início de vigência da lei, cujo objeto seja a operação de serviços em municípios da região metropolitana.

Vale notar que, caso essa interpretação prevaleça, a inclusão da locução “parcerias público-privadas” neste dispositivo provocará uma certa antinomia com a regra do caput, que literalmente aparta as parcerias público-privadas da incidência daquele limite. Como a limitação do caput é mais abrangente do que a limitação que resulta da exceção feita pelo § 4º, a convivência destas regras ensejará uma antinomia normativa. Parece-me, contudo e como já referido, que a norma do caput é claríssima ao preservar as PPPs da incidência daquele limite de 25%, que se afigura aplicável restritivamente às hipóteses de “subdelegação”. Logo, a norma do § 4º teria o condão de excepcionar as “subdelegações” sob estruturação naquelas condições, sendo inúteis ou tautológicas relativamente às PPPs, uma vez estas já estarem livres da incidência daquele limite por força da disposição da norma do caput.

[/vc_column_text][/vc_accordion_tab][vc_accordion_tab title=”Qual a repercussão jurídica da extinção dos contratos de programa sobre as subdelegações, concessões e PPPs que neles estão fundamentadas?”][vc_column_text]

Apesar da redação sofrível, a nova regra do parágrafo único do artigo 18 da Lei 14.3445/2007 parece ter por objetivo evitar a descontinuidade dos contratos de concessão e PPPs celebrados entre a empresa pública ou sociedade de economia mista delegatária e os concessionários (privados) em função da extinção dos contratos de programa que lhes dão suporte.

Nos termos desta regra, os contratos de concessão ou PPP em execução e que abranjam mais de um município ou região ou que envolvam diferentes serviços em um mesmo município ou região serão assumidos pelo controlador da empresa pública ou sociedade de economia mista delegatária, na hipótese de extinção dos contratos de programa, observados os prazos e parâmetros da licitação.

Essa parece ser a única interpretação possível para salvar a confusa redação da regra. Parece que o objetivo do legislador foi evitar que, com o advento da vedação à celebração-renovação de contratos de programa entre as empresas estaduais e os titulares, a descontinuidade destes vínculos (vigentes) possa prejudicar a exploração do serviço objeto da concessão ou PPP, quando o prazo do contrato concessionário for superior ao prazo do contrato de programa.

A hipótese de se ter contratos de concessão formatados com prazos superiores a contratos de programa, aliás, sempre foi uma prática reprovável, dado o risco de não-renovação do contrato. Mesmo que se prevejam mecanismos de compensação do concessionário pela redução de escopo da concessão derivado do risco de não-renovação do contrato de programa, o impacto disso pode ser bastante expressivo no fluxo de caixa dos projetos. Por isso, uma premissa a ser observada nas modelagens de concessões de saneamento sempre foi a compatibilização dos prazos dos contratos de programa com a longevidade projetada para a concessão.

[/vc_column_text][/vc_accordion_tab][/vc_accordion][ultimate_spacer height=”15″ height_on_tabs=”15″ height_on_tabs_portrait=”15″ height_on_mob_landscape=”15″ height_on_mob=”15″][/vc_column][vc_column][/vc_column][/vc_row]

Gostou do conteúdo?

Cadastre-se no mailing a seguir e receba novos artigos e vídeos sobre o tema

Quero fazer parte do mailing exclusivo

Prometemos preservar seus dados pessoais e não enviar spam
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.