Autorregulação e o controle judicial das agências reguladoras

O controle judicial dá sinais às agências de que a autorregulação é coisa séria.
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Silvio Guidi

Advogado egresso

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O Judiciário vem dando sinais importantes para a garantia da segurança jurídica na relação entre concessionárias de serviço públicos e agente reguladores que fiscalizam sua atuação. Exemplo disso, é o recente julgado do TJSP (12/08/2022).

Ao julgar o apelo nº 1047954-31.2021.8.26.0053, o Tribunal entendeu que a ARTESP (Agência de Transporte do Estado de São Paulo) não poderia se desprender de regras por ela própria criadas, as quais condicionavam a conduta da concessionária.

No referido caso, a Concessionária requereu a nulidade de uma multa imposta pela ARTESP. A razão para tal requerimento foi a de que a sanção foi aplicada sem observar um rito específico, criado pela própria agência. Trata-se de um procedimento que impunha à ARTESP que primeiro notificasse a concessionária para resolver a anomalia encontrada na rodovia. A multa seria uma alternativa segunda, cabível somente se a anomalia não fosse resolvida no tempo e na forma adequados. Mas, a ARTESP descumpriu o procedimento que ela própria criara, aplicando a multa sem enviar a notificação prévia.

No acórdão, o relator, além de apontar a imprescindibilidade da notificação prévia, reforçou que a penalidade deve decorrer do inadimplemento da obrigação estabelecida, o que não é possível sem que a Agência cumpra com suas obrigações autoimpostas, demonstrando que a observância dos trâmites legais e infralegais é pressuposto para validade da sanção.

Outro ponto importante reconhecido no acórdão, foi a existência de e-mails enviados por agentes da ARTESP, que indicaram que agência tinha por comportamento o envio de notificações prévias à aplicação da penalidade. Em razão disso, no entender do Tribunal, ao instaurar o processo sem a observância da notificação prévia, a agência quebrou a legítima expectativa da Concessionária e o princípio da boa-fé objetiva.

Com base no referido caso, verifica-se que a norma que disciplina procedimentos internos da agência teve papel fundamental, pois desenhou comportamentos da atividade fiscalizadora e sancionadora. Para a Concessionária, a previsão normativa desses comportamentos gera expectativa suficiente de cumprimento. Por isso, de modo a assegurar a maior previsibilidade e confiabilidade na atuação da ARTESP, a não observância de normas internas (autorregulamentação) não mera irregularidade, mas ilegalidade passível de controle jurisdicional.

Nesse ponto, pode-se apontar que a Concessionária tem o dever de cumprir com suas obrigações, mas em contrapartida tem o direito de conhecer poderes e deveres do Órgão Regulador, especialmente quando a fiscalização puder resultar em sanções administrativas. A existência de normas consolidadas sobre os procedimentos que devem ser seguidos pela agência permite maior efetividade no controle jurisdicional sobre os atos administrativos, de modo a reestabelecer o respeito à legalidade, à segurança jurídica e à boa-fé no contrato administrativo.

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