Concessionária de rodovia não tem responsabilidade por assalto cometido em fila de pedágio

STJ reconheceu que a concessionária que administra a rodovia não pode ser responsabilizada por fato de terceiro.
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Dayana Dallabrida

Head da área de contratos empresariais

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Síntese

Terceira Turma do STJ definiu, por unanimidade, que o crime de assalto cometido na fila do pedágio se revela como fato de terceiro, o que afasta a responsabilidade civil objetiva da concessionária encarregada pela rodovia.

Comentário

Em acórdão proferido em fins de outubro de 2022, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou o entendimento de que a responsabilidade civil objetiva das concessionárias de rodovias não abrange a responsabilização pela prática do crime de roubo com emprego de arma de fogo quando ocorrido na fila do pedágio.

Na origem, a ação teria sido proposta por vítimas de assaltos em filas de pedágio contra a concessionária e a Fazenda Pública de São Paulo, sob o argumento de que ambas deveriam ser responsabilizadas _ no caso da concessionária, objetivamente _ pela ocorrência de assalto nas dependências da praça de pedágio. Tal responsabilização estaria embasada no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que determina que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Inicialmente, os pedidos foram indeferidos pelo juízo de primeiro grau, que extinguiu o processo em relação à Fazenda Pública e julgou improcedentes os pedidos relativos à concessionária. Em segunda instância, entretanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo terminou por condenar a concessionária e, subsidiariamente, a Fazenda Pública ao pagamento de indenização por danos materiais e morais aos autores.

Irresignada, a concessionária recorreu ao STJ, que terminou por afastar os pleitos dos autores em decisão proferida sob segredo de justiça. Para o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, apesar de pacífico o entendimento de que a concessionária que administra rodovia possui relação de consumo com os usuários _ o que ensejaria sua responsabilização objetiva, ou seja, independentemente de culpa, em caso de danos causados ao consumidor _, no caso concreto o assalto deveria ser caracterizado como fato de terceiro, o que afastaria qualquer hipótese de responsabilização da concessionária.

Segundo o relator, o dever da concessionária de garantir a segurança dos usuários da rodovia diz respeito apenas aos fatos relativos à estrita utilização da rodovia, ou seja, é dever que impõe, à concessionária, obrigações como a construção e reparo de infraestrutura, a instalação e manutenção da devida sinalização, dentre outros. Tal dever não se estenderia, portanto, à segurança contra eventuais crimes praticados por terceiros ao longo da malha rodoviária, que não diriam respeito às atividades praticadas pela concessionária e nem seriam riscos por ela assumidos quando da assinatura do contrato. Assim, não se poderia exigir, da concessionária, que disponibilizasse segurança armada ao longo dos trechos por ela administrados, por exemplo, nem mesmo para prevenir a prática de crimes na estrada ou nas estações de pedágio.

Desta forma, concluiu o ministro que a segurança pública seria dever não da concessionária, mas sim do Estado, a quem caberia prevenir o cometimento de crimes. À concessionária, no caso concreto, caberia tão somente a administração da estrada, e não fatores externos que por ela não podem ser controlados. Portanto, diante da ocorrência de assalto em praça de pedágio, estaria rompido o nexo de causalidade entre a atuação da concessionária e os danos sofridos pelos usuários, na linha do determinado pelo § 3º do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que o fornecedor de serviços não será responsabilizado quando provar (i) que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste e (ii) a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

A decisão do STJ se revela acertada na medida em que privilegia a segurança jurídica das relações entre concessionárias e Administração Pública. Importante rememorar que, para além de a segurança pública se tratar de dever do Estado, e não de entidades privadas, a concessionária assume, quando da assinatura dos contratos com a Administração, determinados riscos inerentes ao negócio, estando muitas vezes sujeita, inclusive, à responsabilização objetiva por danos sofridos pelos usuários do serviço por ela administrado. Não é o caso, entretanto, de danos verificados pelo cometimento de crimes por terceiros: a concessionária, nesta hipótese, não possui competência, capacidade nem habilidade para prevenir ou reprimir tais práticas, que se encontram absolutamente fora de seu escopo de trabalho e dos compromissos assumidos contratualmente.

Se trata, aliás, de privilegiar também a economicidade dos contratos: por óbvio, seria demasiado oneroso às concessionárias que, para além de sustentar a regular prestação de serviços, também tivessem que garantir a segurança contra a prática de crimes ao longo de toda a extensão dos trechos administrados. Caso assim não o fosse, os custos teriam que ser suportados justamente pelo ponto mais fraco na relação, ou seja, os consumidores que, ao cabo, teriam que arcar com tarifas mais altas em troca de um serviço que por eles já é pago _ a segurança pública, dever e garantia do Estado.

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