Mercado secundário de crédito e a Lei da Usura

Decisão recente do Supremo Tribunal de Justiça permite cobrança de juros acima da Lei da Usura para não integrantes do Sistema Financeiro Nacional.
Guilherme-Guerra

Guilherme Guerra

Head da área de mercado de capitais

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Síntese

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manifestou entendimento de que a transferência de título de crédito implica na transmissão de todos os direitos inerentes ao título. Dessa forma, o cessionário, mesmo não sendo instituição financeira ou entidade a ela equiparada, recebe o direito de cobrar juros e demais encargos na forma originalmente pactuada, mesmo quando superiores aos previstos na Lei de Usura.

Comentário

Em decisão recente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu pela possibilidade de cobrança de encargos superiores àqueles previstos na Lei da Usura na hipótese de cessão de título de crédito, mesmo para cessionário não integrante do Sistema Financeiro Nacional (SFN). O caso julgou a cessão de uma Cédula de Crédito Bancário (CCB), por meio de cessão civil, para cessionário não equiparado a instituição financeira.

O caso julgado pelo tribunal teve como origem execução de título extrajudicial ajuizada pela massa falida de uma instituição financeira contra uma empresa, ajuizamento este fundado em Cédula de Crédito Bancário. Este crédito executado foi posteriormente cedido para outra empresa, atualmente incorporada por um banco.

Nestas circunstâncias, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), no julgamento em segundo grau, havia entendido que, sendo o cessionário não integrante do Sistema Financeiro Nacional, não seria possível a execução do título com incidência dos encargos originalmente estabelecidos na Cédula de Crédito Bancário.

A 3ª Turma do STJ, por unanimidade, deu provimento integral ao recurso especial para reformar tal entendimento. A Corte destacou ainda que a transferência do título de crédito implica a transmissão de todos os direitos que lhe são inerentes. O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, justificou que “a transmissão por endosso em preto, conquanto indispensável para a conservação das características da Cédula de Crédito Bancário enquanto título cambial, não retira do cessionário que a recebeu por outra forma, a exemplo da cessão civil, o direito de cobrar os juros e demais encargos na forma originalmente pactuada, ainda que não seja instituição financeira ou entidade a ela equiparada.”.

Outro aspecto relevante deste novo entendimento diz respeito à equiparação entre cessionário e endossatário de títulos. No contexto deste julgado, o cessionário de uma CCB, e não apenas o seu endossatário, pode exigir do devedor os encargos previstos no título original, tal como uma instituição financeira. Ademais, não apenas o cessionário, mas todo aquele que possa ter recebido o título de outra forma, que não o endosso, poderá se valer da estrutura de remuneração original prevista para cobrança judicial.

Ademais, o julgamento em questão reforça o movimento de objetificação do crédito, conferindo maior segurança aos investidores e, consequentemente, uma maior circulação do crédito. Assim, a expectativa é de que a decisão contribua ainda mais para o mercado de capitais e para o mercado secundário de crédito. Neste contexto, novas estruturas de investimentos poderão se estabelecer no mercado além dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), sem perder as hipóteses originárias de encargos e a remuneração dos títulos de crédito.

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