Valor de mercado não é parâmetro para revisão judicial de aluguel de lojas em shopping centers

Em ação renovatória de locação de loja em shopping center é necessária a demonstração de situação excepcional para revisão do valor do aluguel
Bruna-Furlanetto-Ferrari

Bruna Furlanetto Ferrari

Advogada da área de contencioso e arbitragem

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Síntese

A discrepância entre o valor percentual do aluguel contratado e a média de mercado não é suficiente para revisão judicial do aluguel, devendo ser demonstrada, pelo locador ou locatário, a ocorrência de situação excepcional que cause significativa alteração no equilíbrio contratual. Foi o que decidiu a Terceira Turma do STJ, a qual entendeu pelo predomínio da vontade das partes, devendo prevalecer o valor estabelecido no contrato de locação.

Comentário

A revisão judicial de aluguéis em espaços comerciais tem sido pauta frequente no Judiciário desde o começo da pandemia da Covid-19. O fechamento de espaços comerciais e shopping centers em razão das medidas de restrição à circulação de pessoas afetou diretamente a economia de contratos de locação comercial, gerando prejuízos a lojistas e empreendedores.

Diante deste cenário, o Superior Tribunal de Justiça – STJ deu mais um passo para estabilização de uma polêmica questão, estabelecendo um novo critério para aferir a possibilidade ou não da alteração judicial do valor do aluguel previsto em contrato.

Trata-se do entendimento proferido no julgamento do Recurso Especial nº 1.947.649/SP (16.09.2021), no qual a Terceira Turma do STJ entendeu pela impossibilidade de revisão judicial do valor do aluguel em locações comerciais com base no valor de mercado praticado em contratos semelhantes. Assim, eventual pretensão de diminuição ou aumento do aluguel deve ter por base situações excepcionais ou eventos atípicos e imprevisíveis que venham a alterar, de forma concreta, o equilíbrio da relação contratual.

O caso em questão trata de ação renovatória de locação de espaço em shopping center ajuizada por lojista visando a renovação do contrato de locação. No contrato, o aluguel mensal foi fixado em 2% (dois por cento) sobre as vendas líquidas realizadas pelo lojista. O shopping, que não se opôs à prolongação do contrato, requereu, para tanto, a majoração do aluguel percentual, o qual estaria abaixo da média praticada pelo mercado.

A ação foi julgada parcialmente procedente em primeiro grau para o fim de prorrogar o contrato de locação, mantendo o valor percentual do aluguel previsto no contrato original. A sentença foi anulada em julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP, o qual entendeu pela impossibilidade de julgamento do pedido de revisão do aluguel em ação renovatória.

Em sede de recurso especial, por unanimidade de votos, a Terceira Turma do STJ entendeu pelo restabelecimento da sentença, negando o pedido de revisão contratual formulado pelo locatário.

De acordo com a relatora, Ministra Nancy Andrighi, os contratos de locação de espaço em shopping center são marcados por certas singularidades que vão além da mera disposição de espaço para locação, envolvendo a implementação de “técnicas mercadológicas” direcionadas à atração de consumidores. Isto é, a locação de espaço em shopping center visa não somente o uso do espaço físico da loja, mas a implementação de uma infraestrutura destinada a promover a atração do público e rentabilidade do negócio de um modo geral.

Devido às peculiaridades de organização e sucesso de cada empreendimento, não é possível a revisão judicial do valor do aluguel tendo por base os valores praticados pelo mercado, sob pena de se interferir de forma exagerada nas condições livremente pactuadas pelas partes.

Contudo, não se afasta por completo a possibilidade de revisão judicial do aluguel em ação renovatória, desde que comprovada a ocorrência de situações excepcionais capazes de alterar o equilíbrio econômico do contrato, na forma do que prevê o art. 317 do Código Civil.

Nesse sentido, juízes e tribunais têm entendido pela possibilidade de revisão judicial do aluguel em decorrência das implicações surgidas pela pandemia, que impactaram diretamente o funcionamento de shoppings centers. Trata-se de hipótese diversa, na qual as restrições à circulação de pessoas mostram-se como evento atípico e imprevisível, que altera as condições sobre as quais o contrato foi inicialmente firmado.

A exemplo, recentemente, a Justiça Estadual de São Paulo julgou procedente ação revisional de aluguel (autos nº 1011504-72.2020.8.26.0361) ajuizada por lojistas para reduzir, em 50%, o aluguel dos meses em que o shopping permaneceu fechado devido às medidas restritivas impostas por força da pandemia.

 A decisão, que ainda está sujeita a recurso, segue o entendimento que vem sendo aplicado pelo Judiciário, no sentido de confirmar a possibilidade de revisão do valor do aluguel de forma comedida, para o fim de restabelecer, com base nas peculiaridades de cada caso, o equilíbrio econômico do contrato sem onerar excessivamente uma das partes.

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