Síntese
A aprovação da Circular traz importantes inovações à contratação de seguro-garantia, a exemplo da maior flexibilização na contratação, sem a necessidade de padronização de cláusulas. Em linha com as previsões da nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a Circular permitirá a ampliação da utilização dessa modalidade de seguro, preferencialmente a outras modalidades admitidas no âmbito de licitações e contratações de obras, serviços e fornecimentos.
Comentário
A Superintendência de Seguros Privados (Susep) aprovou, após duas rodadas de consultas públicas promovidas em 2021, a Circular nº 662/2022, que estabelece novas regras e critérios para a elaboração e comercialização de planos de Seguro-Garantia. A disposição normativa entrou em vigor no dia 2 de maio corrente e, a partir de 1º de janeiro de 2023, as seguradoras não poderão mais comercializar novos contratos de Seguro-Garantia em desacordo com as disposições da Circular.
O Seguro-Garantia consiste em instrumento securitário que visa a avalizar o fiel cumprimento das obrigações assumidas pelo tomador junto ao segurado no objeto principal, inclusive as multas, os prejuízos e as indenizações decorrentes do inadimplemento. É um mecanismo destinado a cobrir uma relação jurídica contratual, editalícia, processual ou de outra natureza, contra o risco de inadimplemento (default) total ou parcial das obrigações assumidas. Mediante o pagamento do prêmio, a seguradora se obriga ao pagamento de uma indenização, na hipótese em que o tomador não cumpra a obrigação garantida, na exata conformidade com a relação jurídica celebrada, desde que respeitadas as condições e os limites estabelecidos na apólice.
O seguro-garantia já havia sido objeto de disciplina legal na nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021), ao estipular a possibilidade de exigência, nas contratações de obras e serviços de engenharia de grande vulto, de seguro-garantia em até 30% do valor inicial do contrato (atualmente o limite é de 10%), além da possibilidade de a seguradora, em caso de inadimplemento pelo contratado, assumir a execução e concluir o objeto do contrato (cláusula step-in, prevista no artigo 102 da nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos).
A Circular da Susep concedeu maior autonomia e liberdade contratual para as seguradoras instituírem produtos específicos e aderentes a cada caso concreto, sem a necessidade de padronização de produtos e exigência de alusão às condições gerais –foi revogada a Circular nº 477/2013, que previa condições padronizadas para essa contratação. Com isso, a Susep facilitou tanto a aprovação desses seguros, quanto a disseminação do seu emprego em substituição às demais formas de garantia usuais nas contratações públicas, como caução em dinheiro, títulos da dívida pública e carta de fiança bancária.
Há também a previsão de que a ausência de comunicação da alteração do objeto principal à seguradora, ou a sua comunicação em desacordo com os critérios estabelecidos nas condições gerais do seguro, somente ensejará a perda de direito ao segurado caso seja agravado o risco e, concomitantemente: (i) tenha relação com o sinistro; ou (ii) esteja comprovado, pela seguradora, que o segurado deliberadamente silenciou de má-fé.
Além da necessária aderência à nova lei de licitações e contratos administrativos, dentre as principais inovações da Circular, destaca-se: (i) a possibilidade de o seguro não garantir todas as obrigações do objeto principal, conforme interesse do segurado; (ii) a possibilidade de atuação da seguradora na mitigação do risco de ocorrência de sinistro, o que configura um diferencial bastante positivo sobre as outras formas de garantia e pode impulsionar a expansão desse seguro; (iii) a introdução de mecanismos de transparência e mitigação de riscos de assimetria de informação, elemento apontado por especialistas como um dos principais problemas na prática operacional do seguro; (iv) a fixação, em regra, de que a vigência do seguro-garantia seja igual à vigência da obrigação garantia, exceto nas hipóteses em que houver solicitação expressa no objeto principal ou em sua legislação específica; (v) a possibilidade de inclusão de terceiros como beneficiários da apólice.
De outro lado, havia muita expectativa pelo mercado de que a Circular disciplinasse de maneira minuciosa a cláusula step-in. No entanto, a Circular limitou-se à reprodução das determinações legais, não impactando neste tema específico.
Em conclusão, tem-se a expectativa de que, nos próximos anos ocorra uma ampliação exponencial do emprego do seguro-garantia nas contratações públicas, sobretudo nas concessões e nos contratos de edificação de obras e serviços de engenharia, justamente pelos elementos vantajosos que ele apresenta em relação às demais modalidades de garantia, agora ampliados pela edição da Circular nº 662/2022.